domingo, 8 de fevereiro de 2009

Escrever coça.

A razão escalda ao menor acorde.

Não existe nada que supere a música.

Essa coisa de escrever não é nenhum pouco digna. Talvez até seja, mas não para seres que não suportam a solidão.

Escrever é algo que exige suor. Escrever é algo que exige testa.

Se o suor escorrer pela testa e beirar as orelhas, é sinal de que algo está acontecendo.

Mas o fato é que nem sempre algo está acontecendo. No máximo, está acontecendo uma reação química da pele frente ao calor. Além disso, a arte é uma aposta.

Mas quando se dá a arte?

A vida é a arte do encontro, já disse o Vinícius. Mas o fato é que a arte é o desencontro da própria vida. O sujeito que se mete a escrever, com certeza deve ter no mínimo uns três recalques. E não me surpreende o fato do David Lynch renegar a análise por medo de sepultar seu cinema.

É preciso se desprender de si para escrever. É preciso não haver frase definitiva em qualquer escrita. Frases definitivas existem para as ciências e ponto final. A escrita, essa escrita do peito ao qual me refiro, mais sensível que sentimental, ocorre distante de qualquer conveniência acadêmica.

Claro que é impossível amputar a razão de qualquer texto. O próprio fato de falar trás em si uma razão que faz com que possamos falar. Mas isso não quer dizer que as palavras devam estar impregnadas de quaisquer sensos comuns. Que somos humanos, com certeza somos, pelo menos biologicamente. Entretanto, isso não significa que nossos sentires e pensares trabalharão todos da mesma forma. Se essa assertiva fosse verdadeira, psicanalistas e afins teriam muito mais clientela do que tem hoje.

Verdade é que escrever exige solidão, nem que seja no burburinho. E que solidão exige preparo. Mas o preparo para a solidão não envolve músculos. Ao contrário, envolve sentires. Afinal, real é esquecer: no mais, lembramentos. É disso que somos feitos.

Por isso não quero conceituar minha arte. Se houvesse uma conceituação, me livraria de cada frase no exato momento em que ela é escrita. Distante dessa definição, quero ao menos entender minhas palavras ou o sentido de alguma frase, nem que esse sentido seja mais sentir que sentido.

Se o Joyce dirá o contrário, paciência.

Se o Nassar me crucificar na aldeia de alguns coelhos, paciência também.

No mais, permaneço aqui dentre cervejas e amores, procurando algum acorde que me soe tão verdadeiro nas letras quanto me soam verdadeiras as músicas que ouço.

Tudo bem que a razão escalde ao menor acorde. Isso é tão normal quanto um engove. Contudo, quero escrever sendo acorde, quero ser sendo música. E para isso é necessário dissipar qualquer certeza, ainda que eu acredite que o Bauman esteja errado em muitas linhas.

Para ser música, é necessário respirar. Para fazer música, é necessário saber tocar. Para criar música, é necessário viver. E para viver, é necessário que ao menos respiremos.

Mas logo vem a pergunta: por qual razão respiramos?

Tudo se dissipa ao menor conceito.

Escrever coça.

4 comentários:

pensar disse...

Aqui vai um poema meu, de um tema presente em suas palavras:

Saudade?/Vontade


Largo sentir, respira fundo
Cala diante da saudade
E tão nobre verdade,
que era engano

Saudades são lágrimas do passado

Por não entender,no labirinto se viu
e diante da nostálgica visão
o espelho não a refletia

Desminto o que nunca menti
se disse saudade para ti
foi tropeço do disfarce
segredo do conceito

O que sinto não tem medo
O estrondo vem do peito
da vontade, das vontades
do querer, querida

Cai o véu que sufoca
Abre-se o palco do mar
Vida de querer
Que seu olhar cristalino
Me reflete que e presente

Anônimo disse...

put´s que viagem!!!
caraca...hein!!!

E digo: Escrever é algo que exige sentir!

E sigo respirando!

beijos!

adri antunes disse...

me mata uma curiosidade: quando vc posta aqui no blog já tem o texto definido ou vc vai escrevendo assim, como um confessar, ou um pensar alto? tenho uma certa inveja de vc, inveja boa, claro, não tenho um fôlego desses, minhas frases são sempre mais curtas e os textos infinitamente menores...
beju e bom diaa!

Eduardo Matzembacher Frizzo disse...

Hoje em dia minha única definição é respirar. Estou em busca da última palavra: aquela que não pode ser pronunciada e apenas existe escrita, como algo maldito ou o que o valha. Viagem é remar ao contrário na direção da nuca. Viver é criar a sua própria maionese de estimação e nela pensar que constrói uma carreira e uma casa. Problema é que isso vicia. E obrigado por todos os comentários. Não me saber só nesse deserto virtual, saber que vocês estão aí, é maior que tudo. E me traz uma felicidade que nenhum sorvete pode pagar. Afinal, sempre preferi cervejas. Até mais e beijos, moças.