terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

E mantendo as boas maneiras, bom Carnaval a todos, porque no mais sigo galo véio com meu mate que pela janela não criou asas.

Tem um terreno baldio aqui na frente do prédio. Nele crescem essas plantas que crescem em terrenos baldios. Olhando pra elas ali da sacada, chego a pensar que são folhas de maconha. Mas o fato é que nunca vi folhas de maconha fora dos programas do Datena e das camisetas do Gabeira. Então por qual motivo me veio esse pensamento? Acho que pela inutilidade tanto da maconha quanto do terreno baldio.

Primeiramente, que fique claro que não tenho nada contra maconheiros. E muito menos contra terrenos baldios. Se querem ficar dando risada de um copo de suco de uva que parece o Universo em expansão, tudo bem, não tenho nada a ver com isso. Se querem deixar um terreno criar mato até que as formigas montem um formigueiro tão, mas tão grande, que se torne uma metrópole de formigas, tudo bem também. Mas o que mais me deixa irritado, é a quantidade de coisas inúteis que existem no mundo. E mais do que isso: o quanto de inutilidades acumulamos com o decorrer dos anos.

Olhe pra sua estante. Olhe pro seu guarda-roupa. Não existem livros e revistas e camisas e camisetas que não precisavam estar ali mas ainda estão ali? Não existem por cima da mesa da sala aqueles bibelôs ridículos que alguma tia trouxe de uma viagem à Fortaleza? Se alguém me disser que não, estará mentindo. Mas também não tenho nada contra a mentira. Quanto a ela, estou com o Quintana: “a mentira é uma verdade que deixou de acontecer”. E tenho dito.

O que me irrita de verdade nesse mar de inutilidades, é que com o tempo acabamos nos tornando dependentes delas. Quando eu tinha oito anos, por exemplo, depois que assisti um Globo Repórter que falava sobre extraterrestres e logo depois assisti um filme chamado Fogo no Céu, o qual contava a história de um camarada americano que foi abduzido por uns extraterrestres cor-de-rosa, passei dois anos dormindo com o colchão no chão do quarto. O meu argumento era simples: pensava que se deixasse o colchão no chão, os extraterrestres teriam maior dificuldade de me abduzir. Mas só hoje é que me dou conta do óbvio: por qual motivo extraterrestres vindos sabe-se lá de qual galáxia iriam querer me abduzir?

Até onde me consta, não sou um sujeito nem bonito nem feio e muito menos especial. Não que eu queira dar uma de Zé Bonitinho ou me fazer de galã pra ganhar elogios. Mas é que uma cruza minha com uma extraterrestre cor-de-rosa não ia sair algo que preste. Se fosse pelo lado intelectual, até poderia dar algum crédito a esses seres de outro mundo. Sem qualquer humildade, sempre tive alguns entendimentos no mínimo legais sobre certas coisas. Mas entendimentos legais não chegam aos pés de entendimentos reais e de viagens espaciais, o que faz com que esse meu medo infantil de extraterrestres se torne uma coisa completamente boba e desprovida de lógica assim como um celular que toca Barbie Girl. E portanto é inútil.

Do mesmo modo que passei dois anos dormindo com o colchão no chão por conta dos ETs, isso lá nos meus oito anos, passei mais uns três anos dormindo na cama com um pé encostado na parede e uma garrafa d’água do lado da cama. A coisa da garrafa d’água herdei do meu pai, porque ele sempre leva uma garrafa d’água pro quarto. Mas isso de pé encostado na parede não sei de onde tirei e nem sei porque me dava alguma segurança para o sono. E se eu contar que passei por uma época, a qual durou mais ou menos seis meses, na qual só conseguia dormir com o corpo completamente coberto, ninguém acredita. Ou será que acredita? Bem: se tem gente que monta seitas em homenagem aos extraterrestres, sejam eles cinzas, cor-de-rosa ou verde-limão, acho bem possível que esse meu relato seja completamente verídico aos olhos de qualquer leitor. Se acham que até o Big Brother e o Estado Democrático de Direito são reais, vá saber o que se passa pela cabeça das pessoas.

Mas o que exala de tudo isso, é a inutilidade que permeia nossa vida. Por exemplo: pra quê tantos livros publicados sendo que mais da metade nem a denominação “obra” merece? Isso é no mínimo um crime contra a natureza, porque cada livro publicado corresponde a algumas árvores derrubadas. Por isso que talvez eu esteja primeiramente me aventurando pelos lados da internet antes de publicar qualquer coisa. Deus me livre meus possíveis filhos chegarem a me dizer:

- Pai! Tu é um criminoso, tá ligado?! Derrubou cem árvores por tabela pra escrever esse lixo! Essa bosta cheia de conceitos que ninguém entende! Te liga, porra!

Antes de ouvir isso, prefiro que minhas palavras fiquem aqui dentre zeros e uns, fazendo o que tem que fazer aos olhos de quem quer fazer alguma coisa com elas, se é que sua inutilidade também não se encontra no próprio fato de elas existirem.

Mas voltando ao ponto central do que falo, ou seja, a inutilidade, hoje (segunda-feira, friso) saí pela manhã com a intenção de resolver mil coisas. E o que encontro? Tudo fechado: cartório, fórum, bancos, lojas, bares. E por quê? Certamente porque o povo passou a madrugada de borracheira e folia e não estava em condições de trabalhar. Ou quem sabe, para incorrer em uma lógica mais lógica ainda, se é que isso existe, os patrões resolveram dispensar todo mundo pra deixar os chicotes mais e mais ardidos no lombo dos trabalhadores, hipótese esta que considero a mais viável e cabível já que estamos falando do Brasil – país mandado e desmandado pelos uivos do FMI e dos Senhores Feudais do Senado.

Por conta desses motivos, é que defendo que o dia ideal pra se fazer festa é na sexta-feira. E por quê? Primeiro: se você trabalha no sábado, fica meio assim, meio assado, mas leva na boa a ressaca da noite anterior, isso porque poderá descansar logo mais. Segundo: se você não trabalha no sábado, tem o sábado e o domingo pra curar a canseira da festa. Terceiro: se você é daqueles que gosta de fazer festa na sexta e no sábado e ainda por cima não trabalha no sábado, acaba de chegar ao paraíso, já que seu final de semana será muito mais do que agitado, badalado e coisa e tal, muito embora seu domingo beire uma UTI hepática.

Sendo assim, pra quê Carnaval? Pra quê fingir que tudo está bem por três, quatro, cinco dias e depois acordar vomitando a própria bile ou quem sabe a fatura do cartão de crédito? Essas coisas tropicais aqui no meu mundo sub-tropical, não fazem sentido algum. Que a Semana Farroupilha deve ser totalmente dedicada ao gauchismo, é outro papo. Mas Carnaval pra quê? Pro pessoal da Bahia trabalhar três meses e viver o resto do ano com o dinheiro dos turistas? Que me perdoe o resto do país, mas não encaro as coisas assim. E admito que toda crítica tem uma grande parcela de inveja, isso pra já não me jogarem pedras de cara.

Mas país que quer ir pra frente, país que quer ser “o país do futuro”, o que falam desde 1500 aqui pra esses lados da América, tem mais é que se lascar trabalhando em todas as áreas possíveis – e mais especificamente aquelas que usam mais o cérebro do que o bíceps. Se os patrões querem que os chicotes ardam no rabo dos trabalhadores, então que as coisas sejam invertidas: os trabalhadores que larguem os patrões e os patrões que vão se ver com a Justiça do Trabalho. Claro que alguns vão me dizer que se você fizer isso, irá entrar para o index dos funcionários indesejados, daqueles que se revoltam contra o sistema.

Mas aí eu pergunto: que sistema se sustenta sem revolta? Até mesmo meu computador se revolta contra mim de vez em quando. Tem horas que um parágrafo some do nada e só depois me dou conta de que ele era uma porcaria. E por quê? Porque de revolta em revolta, de trabalho em trabalho, é que as coisas andam pra frente. Mas ficar nessa de feriados pra cá e pra lá, é coisa de gente que quer que o mundo acabe em barranco pra morrer escorado. E pra ser mais franco ainda, até essa coisa de Semana Farroupilha me irrita um pouco por conta do excessivo bairrismo, apesar de eu ser viciado nessas coisas. No fundo, tudo é motivo pra borracheira nesse país, seja ele do norte ou do sul. E enquanto isso os bancos nos cobram taxas metafísicas das quais a procedência sequer imaginamos, mas que com certeza financiam as orgias que nenhum Calígula ou Fellini imaginariam em um delírio à base de cogumelos de bosta de vaca.

Retomando a calma e o fôlego, já que por pouco não finquei a cuia pela janela, uma vez que falei em morrer escorado em barranco, esse prédio no qual eu moro fica numa ladeira – a qual, grosso modo, é um jeito chique de chamar um barranco. Ou melhor dizendo: ao pé de um morro – ou barranco, a escolha é sua, caro leitor. Acontece que essa ladeira ou barranco tem uma descida cavalar pra chegar até a garagem e uma subida que alguns corsinhas não conseguem vencer pra sair da garagem. Talvez por conta disso exista o terreno baldio com as plantas que, apesar de lembrarem folhas de maconha, são apenas plantas que crescem em terrenos baldios que servem de metrópoles para formigas.

Mas por mim que as coisas continuem assim. Façam festa, gastem o que não têm e transem com que não conhecem sob o risco de acordar ao lado de um sujeito peludo vestido de bailarina russa. E se querem se contentar com o que os patrões impõem e viver uma vida de um final de semana em Gramado a cada cinco anos, daquelas que o sujeito tira fotos e mais fotos pra mostrar pros netos o foundie com salame, queijo e melancia que devorou com quatro garrafas de vinho da Serra Gaúcha, tudo bem também. Sinceramente, não me importo. A única vida que posso mudar é a minha e ponto final, a qual já tem problemas demais a serem resolvidos. Os outros que cuidem das suas. O máximo que posso fazer é escrever ou planejar atentados terroristas.

Mas como ainda não apelei pra violência e nem compactuo com os métodos do Bin Laden e muito menos dos caras lá de Israel, fico aqui detrás do computador com um sorriso irônico nessa madrugada de Terça-feira de Carvanal que parece que logo trará chuva. E acho até legal a hipótese de ver os foliões pegarem uma baita de uma gripe depois de um banho de chuva. Pura maldade, confesso, a qual, entretanto, não chega aos pés das taxas que o seu banco cobra – e isso eu garanto.

E por quê?

Porque, se não existe revolta, tudo é tão inútil quanto esse texto que acabo de escrever. E se falei besteiras, viva o besteirol, porque, afinal, é Carnaval, meus caros pierrôs e colombinas.

E mantendo as boas maneiras, bom Carnaval a todos, porque no mais sigo galo véio com meu mate que pela janela não criou asas.

5 comentários:

Biba disse...

Nossa, gostei muito destas suas divagações, se posso chamar assim. O que interessa é que você me fez imaginar até onde mora e fiquei cansada com a subida que deve ter até chegar no seu prédio. Nossa! Mas é isso, vivemos cercados de inutilidades, você tem razão. Eu vivo me culpando por isso, mas continuo juntando porcaria. Outra coisa é essa do carnaval. É tudo um fingimento, uma história sem moral da história. Acho que é isso.Boa mateada pra você. Também tomo meu chimas.
Beijo grande,
Carpe Diem!!!

adri antunes disse...

nossaaa, vc tá mto revoltado hj, Du!!!! quéisso? eheh, a propósito, assistiu a entrega do oscar? tu sabe que, pra mim, o maior injustiçado da noite foi o Wall-e! eu simplesmente adoroooo animações, talvez por causa da magia, do encantamento, ou da criança que mora em mim ou por que tb trabalho com ilustração! enfim, no nosso futuro blogue pretendo escrever sobre animações e consequentemente sobre o meu querido Wall-e!!!! eu até faço a voz dele! ehehe
bom carnaval, bom chimas, eu por aqui sigo lendo Peter Burke! bjussss

gloria disse...

eu sou uma apaixonada pelos que resistem, se rebelam e criam lentes que podem ver o mundo em outras direçòes. Como diz Deleuze: inverter o funcionamento dos órgãos; poder sentir assim: meu fígado está cheio de amor por você. Por que essa hierarquia onde o coração é o centro de tudo? pois eu não, transita em cada parte de mim um coração a flor da pele.Na ponta dos dedos uma percepçào cerebral, discernimento tátil. Só sei do que sinto, o resto eu armazeno quando posso sob o título de informação. para essas coisas nào gasto nem minha memória, fica lá, arquivado e se precisar aciono. Interessa-me os saberes que transpiram vida. teu texto é uma anotaçào em vibraçào de um cotidiano denso. mesmo sob barrancos e terrenos baldios. a vida borta em profusào. bjs (quando poder entrar no msn, te adiciono.

Joice Nunes disse...

gostei desse lugar
arrumei um novo vizinho
um abraço

Anônimo disse...

eu sonhei durante muito tempo com seres de outro mundo. acho que eu adolescente como todo adolescente se achava de outro mundo e ansiava por um outro mundo no qual me achasse. também punha o pé na parede para dormir, mas era porque muitíssimas vezes o calor do Tocantins era insuportável. tenho horror às inutilidades, mas defendo a minha inutilidade até o fim (ou, quem sabe, um dia queira fazer algo útil). quanto à revolta, é imprescindível, conquanto a minha sempre tenha sido inútil, desde que não levou à ação. contento-me em ter aprendido, ao menos, a respeitar. ainda que queira esmurrar muita gente.
p.s.: acho os maconheiros uns chatos, essa normalização do consumo um acinte à inteligência, os patrões, em geral, a escória e o Carnaval, ainda que eu goste de farra, uma das festas mais tediosas da face da terra (como prezo a experimentação, ainda piso na Sapucaí! - ahahaha).