domingo, 23 de novembro de 2008

nunca houve nada de sério na minha vida.

pollock.
nunca houve nada de sério na minha vida. acho até que só sou sério ao escrever e às vezes ao falar. e ainda depende do que escrevo e falo. o que talvez não seja bom, porque afinal eu vivo disso. mas fato é que me vejo em palavras. por vezes sonho e sinto em discurso. quando me dou por conta, teço mil universos onde a razão inexiste. somente a palavra: a minha palavra demiurga, ditadora. no mais, vou levando aos trancos. dinheiro arrumo. amigos tenho. contas atraso mas pago. e falando em pagar contas, descumpri uma promessa que fiz de escrever neste espaço nos sábados, nos domingos e nas segundas, sendo que segunda passada nenhuma palavra minha por cá surgiu. e pra falar a verdade, mesmo hoje estou descumprindo com minhas palavras, uma vez que são quatro e pouco da manhã e portanto é domingo, apesar de na minha cabeça ainda ser sábado. nunca gostei dessa insistência em dizer que o dia começa antes de amanhecer. pra mim, as datas do calendário só mudam ao raiar do sol. o que acontece antes é o dia anterior. ou seja: hoje pra mim é sábado. logo, não estou em dívidas para com minha promessa, já que se eu escrever amanhã durante o dia, enquanto houver sol ou enquanto ainda não houver amanhecido a segunda, ainda será domingo. e pra essa contagem sigo tão-somente o calendário do que sinto. mas o que sinto? acho que o tempo dedetiza a vida. o tempo faz com que sigamos ratos rastejando em bueiros. o tempo nos guia por tantas ruas, por tantas esquinas, que tudo se esvai em uma calha imensa. resta saber no telhado de qual casa está esta calha. porém, tudo pode acontecer em um só momento, isto no sentido de que ao tempo em que passamos na rua, a calha escoa água ou éter em nossa cabeça e dilui nosso corpo, fazendo com que o mesmo não rasteje, mas escoe, simplesmente escoe nos bueiros. se passar por ratos, nem ratos serão, já que nomes não existirão. com as baratas acontecerá o mesmo. mas o que acontecerá conosco ao nos esvairmos de todos os signos? o que acontecerá com nossa razão ou com nossa percepção do mundo quando nenhum juízo matemático ou geométrico nos sobrar? ainda existiremos? é nisso que penso ao dizer que o tempo dedetiza a vida como se estivesse atrás de uma praga. o tempo é aquele que nos pega pelos cabelos quando estamos quase chegando no infinito. o tempo é o relógio que desperta, é a mulher que reclama, é a vida que corre e que escorre sem que você perceba. se tudo é uma questão de tempo, quem perde é o espaço. se tudo é uma questão de tempo, uma verdade somente é verdade enquanto transcorre em um determinado espaço de tempo. logo, o espaço resta subsumido ao tempo, de modo que o próprio tempo acaba por anular o espaço. dizer isso novamente me remete a borges. pensar no infinito e no finito sempre me remete a borges. li em algum ensaio seu que se o universo fosse apenas tempo, sua matéria principal seria a música. pra falar a verdade não sei se foi bem isso que ele falou, mas sinto o que estou lembrando com estas palavras. lembrar ou inventar isso me faz pensar em qual seria o som do nosso tempo. certamente que não seria algo ao feitio de mozart. no máximo estaria perto de um stravinsky, e isto pra ficar nos clássicos. mas acho que mesmo assim seria algo um tanto atrasado demais aquela coisa meio dada do stravinsky. correndo um pouco mais as décadas, eu poderia dizer que nosso tempo é punk rock, que nosso tempo é grunge ou rave. mas nada disso soa como o tempo que sinto. o tempo que sinto soa como o estalar da minha coluna que repentinamente se cansa de estar torta e procura um ângulo reto. o tempo que sinto soa como meus dedos por sobre o teclado, como meu estômago que ronca. tudo isso que soa de mim, soa como o tempo que sinto. os nervos que no pescoço estalam, a garganta que engole saliva, tudo isso canta, tudo isso dá ecos ao tempo que sinto e me faz perceber que estou vivo. dizer que o tempo dedetiza a vida está correto sim, por mais que isso aparentemente dê à vida o condão de uma praga. mas e por quê ser uma praga estaria errado? o que é uma praga? praga me lembra algo que se propaga. e se praga me lembra algo que se propaga, é esse o significado que adotarei. se praga me lembra algo que se propaga, o tempo é aquele que corre atrás dessa praga, que joga ddt nessa praga, que faz com que a mesma pare e diga que nunca mais vai voltar a ser vida. isso me recorda música sertaneja. mas não quero entrar no mérito. fato é que sentei aqui pensando que iria escrever algo interessante. e se tais palavras são interessantes, não tenho a menor noção. o discurso na verdade é como uma loteria, ainda mais quando você não pretende ter controle sobre ele. as coisas vão saindo e depois, caso você pretenda organizá-las, apenas dá uma aparada aqui e ali e pronto. e se existe algum leitor deste espaço, certamente ele já deve estar puto comigo por conta do modo como os textos estão dispostos. entretanto, isso é deliberado e sim!, eu tenho a intenção de dificultar a leitura. talvez com o tempo mude de opinião e mude o formato da disposição dos textos. porém por ora fica assim mesmo. essa coisa de ler também sempre me soou relativa. andar pelas ruas e ver as pessoas andando pelas ruas também é uma forma de ler. a arte se encontra na delimitação do tema, por mais que isso soe científico demais. e somente quando o artista consegue delimitar o tema é que a coisa engrena. caso contrário fica como esse texto: começa daqui, puxa dali, e no fim, por mais que eu saiba que irá retornar ao começo, já que isso sempre acontece por mais que eu não queira, não chega a lugar algum. porém, chegamos a algum lugar com nossa vida? saímos do ventre materno. o médico nos pega e nos bate na bunda. choramos. logo depois umas luzes fluorescentes e umas enfermeiras com máscaras nos pegam. (estaria aí o motivo da tara de tantos homens por enfermeiras?) apenas uma meia-hora depois nos levam pros braços da nossa mãe. lá é que olharemos pros olhos dela e supostamente, segundo ouvi uma vez, formaremos nossa personalidade. mas o que isso quer dizer? porra!, se antes as enfermeiras já nos olharam, a realidade é que nossa personalidade se formou no susto que tomamos com o tapa do médico na nossa bunda e com aquelas mulheres de máscara! não me venham com besteiras! logo, nossa personalidade se forma pelo medo e com o medo por conta do estranhamento. e é esse medo e esse estranhamento que irão guiar toda nossa vida. quando acharmos alguém para amar, isso será estranho. iremos primeiramente estranhar aquele sentimento, aquele tremor, aquele revirar de olhos ao sentir o cheiro daquela mulher. talvez possamos até mesmo nos casar, talvez possamos até mesmo morar com essa mulher, e com o tempo quem sabe as coisas se tornem complicadas, já que não tem graça relacionamento sem briga. que graça teria um romance perfeito, daqueles de eu te amo pra cá e eu te amo pra lá toda hora? isso parece coisa dessas guriazinhas que ficam dizendo que amam as amigas. raios!, quem é que sabe o que é o amor? ninguém sabe e nunca vai saber. uma vez eu disse que o amor é anti-natural. e acho que isso é assim mesmo. e por quê o amor é anti-natural? porque o amor tende a uma unidade que a própria física não permite. se o amor tende a uma unidade que a própria física não permite, ao passo que o amor é anti-natural, nós somos, pelo menos biologicamente, naturais. porém, podemos modificar nosso corpo. podemos colocar silicone, botox, piercing. logo, nem nosso corpo é natural porque nosso corpo pode sofrer intervenções. e se estas intervenções podem modificar o nosso sentido físico para conosco e para com os outros, nosso corpo deixa de ser natural, porque passa a ter um caráter cultural, o que me leva a crer que toda a criação é cultura e que ao mesmo tempo toda criação é impossível. o único processo criativo que existe é o processo do jorro. o resto é trabalho de marceneiro. e o jorro, coisa sexual mesmo, acontece só de vez em quando. não existe essa coisa de encher a cara de drogas ou álcool e sair fazendo obras-primas ou irmãs. isso é coisa de abobado. só quem se dedica ao trabalho de marceneiro pós-jorro é que pode fazer algo que preste. do contrário, porcaria sai, o que talvez se aplique a isto que estou escrevendo. contudo, como sou eu que escrevo, me faço cafetão de mim mesmo, me faço eterna prostituta. só não quero morrer antes do tempo certo de ter gastrite, apesar do meu estômago ainda (ou já) doer (hoje por conta do café). me suicidar sei que não vou, pois quem quer fazer isso nem escreve isso. excluam o kurt cobain desse baile, porque ele já é outra coisa que não sei como falar, porque o bom mesmo é perder os limites e assim ir vivendo e não reconhecendo o próprio garrancho por vezes. o poeta, afinal, é um irresponsável. porém eu sou poesia e por isso não me sujeito, já que sou apenas verbo, o que faz com que tudo mude. e realmente nunca houve algo sério em minha vida. e pra completar o quadro, quero perder a seriedade até mesmo ao escrever, porque na verdade só levamos à sério aquilo no que não acreditamos. é uma fuga. resta saber do quê, porque pra onde já seria pedir demais.


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