domingo, 12 de julho de 2009

A Prisão da Liberdade.

Semana passada escrevi sobre o que agora denomino como Lógica do “Carpe Diem”. Essa lógica, refém do imediatismo, dissemina o medo na sociedade pelo simples fato de que esse imediatismo pode cessar de uma hora para outra. Exemplo disso é o medo que todos têm da violência urbana. Esse medo diz do temor de não fruir daquilo que as cidades mais oferecem. Mas o que é que as cidades mais oferecem? A resposta é clara: o consumo. Extrai-se disso que os temores atuais, ligados ao imediatismo da Lógica do “Carpe Diem”, estão para o medo de não termos uma relação segura com o consumo.

Essa relação segura com o consumo, entretanto, sustenta-se a partir da própria insegurança da sociedade para com a possibilidade de consumir. Essa insegurança está relacionada principalmente com o medo de perder o emprego. Perder o emprego, nesse sentido, não significa apenas perder a renda com a qual o indivíduo se sustenta. Ao contrário, significa perder seu lugar na estrutura social. Perdendo seu lugar na estrutura social, os cartões de crédito e mesmo as relações afetivas estarão prejudicadas, pois se a liberdade na cidade está para a possibilidade de usufruir das oportunidades de consumo que a cidade oferece, tudo se torna objeto de consumo.

Logo, o que se nota é que a liberdade, antes de ser uma questão filosófica ou jurídica, está para a possibilidade do indivíduo usufruir das oportunidades de consumo que a cidade oferece a partir da sua condição na estrutura social, a qual está diretamente ligada ao seu poder econômico. Consequentemente, a liberdade não é para todos. O que se conclui é que se a liberdade da atualidade está relacionada à possibilidade de consumo do indivíduo, a liberdade não existe. Ou melhor: existe para poucos enquanto inexiste para muitos. Esses poucos é que poderão aproveitar a oferta intermitente que a sociedade de consumo oferece, viajando pelo globo e não tendo qualquer preocupação com a profundidade das suas relações com as coisas e com as pessoas, porque se o que garante a liberdade é a Lógica do “Carpe Diem” relacionada à possibilidade de consumir, tudo que me prende a algo ou alguém é tão fugaz quanto o ato da compra.

Contudo, os muitos que não poderão provar dessa liberdade ficarão presos em suas condições econômicas relacionadas à estrutura social na qual estão inseridos. Geralmente reféns de contas e dos seus empregos, não terão a liberdade para consumir tanto quanto gostariam. Porém, se não terão a liberdade para consumir tanto quanto gostariam, irão se endividar eternamente na expectativa de que no futuro poderão cobrir suas contas do hoje. E o que acontecerá será o surgimento do “devedor eterno” do qual falei na última quinta-feira. Mas o estranho de existir apenas uma liberdade relacionada à possibilidade de consumo, é que nem mesmo aqueles que podem usufruir dos produtos que estão à venda por todo o globo são livres. Sua liberdade, ao contrário, é uma liberdade existente até segunda ordem. Assim, se de um lado existe um indivíduo que busca de todo modo essa liberdade, por outro lado existe um indivíduo que pretende manter de todo modo essa pouca liberdade conquistada.

Desta forma, tanto um quanto outro irá sofrer as conseqüências que o excesso de velocidade e a ausência de profundidade provocam. Esses efeitos, pode-se dizer, não são nada diversos dos efeitos que os psicotrópicos provocam nas pessoas. Se a droga proporciona uma ilusão de liberdade relacionada a uma substância química e o consumismo provoca uma ilusão de liberdade pela possibilidade de comprar, o que temos é uma prisão da liberdade e jamais a liberdade.

Mas se a liberdade atualmente está para a possibilidade de consumir, não se deve julgar sua verdade ou mentira. Talvez se deva, muito antes de formular conceitos morais acerca dessa realidade, diagnosticá-la da maneira mais crua possível, pois a única coisa que pode frear o imediatismo consumista e medroso da Lógica do “Carpe Diem” é justamente a profundidade que lhe falta. Se o rio é profundo ou não, temos de crer na sua profundidade mesmo que a água seja tão barrenta quanto nossa indecisão. Caso nos falte coragem, a superfície será nosso lugar. E ofertas não faltarão para que esqueçamos que ao nosso lado tudo desmorona.

Um comentário:

pensar disse...

Muito bom Edu,
A sociedade atual está imersa na inconsciencia, e a ela tudo falta, entao a ansiedade e a angustia dominam.A necessidade de prazeres imediatos(compras, drogas, sexo, relacionamentos, comida), todos eles calcados na falta, no vazio q ha na pessoa.Se transcendermos essa superficialidade que é a mente, nao teremos medo ,nem falta, nem posicoes e imagens a sustentar.Isso é a verdadeira liberdade...E te pergunto:
O que te falta?


Bjos Mari