quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Recém abriu sol mas o dia permanece branco.

Chovia até agora pouco. Recém abriu sol mas o dia permanece branco. Receio que suba um calor infernal dessas poças que estão nas ruas. Mas hoje é o dia que traz consigo a Noite de Natal e eu deveria estar feliz. A razão disso desconheço, porém sei que é assim. Haverá peru, panetone, frutas cristalizadas e tudo o mais que existe em uma Noite de Natal. Parentes trocarão abraços, primos lembrarão de besteiras que fizeram juntos e certamente algum tio tomará uma cervejada daquelas e procurará algum santo pra ficar conversando até de manhã. Tudo como sempre foi nestes meus vinte e quatro anos de vida.

Mas eu quero isso?

O mero fato de direcionar uma pergunta sobre os fatos da Noite de Natal faz com que todas minhas convicções balancem. Em realidade (em realidade mesmo, aquela coisa que chega a apertar a garganta) nunca vi muito fundamento nessa tal de Noite de Natal. Pra começar, ninguém sabe ao certo quando Jesus Cristo nasceu. O que aconteceu foi que a Igreja Católica Apostólica Romana, em algum dos seus intermináveis Concílios onde recebe diretamente de Deus as ordens que irão movimentar os homens cá por este planeta, decidiu que Jesus Cristo havia nascido no dia vinte e quatro de dezembro. Ou seria dia vinte e cinco de dezembro? A verdade é que não sei, mas já que estamos falando de Noite de Natal, fiquemos com dia vinte e quatro de dezembro.

Pois bem. Depois disso os poloneses criaram o tal do Santa-Claus que a Coca-cola vestiu de Papai Noel e então todas as fábricas de brinquedos ficaram ricas, a exemplo da Lego, da Estrela e da Gulliver. Mas será que ainda existem a Lego, a Estrela e a Gulliver? Quando eu era pequeno (digamos que fui pequeno até os treze anos e depois virei marmanjo) tinha vários jogos da Lego. Gostava de montar prédios, carros, naves e o diabo-a-quatro. Da Estrela eu devo ter tido alguns brinquedos também, assim como da Guliver. Contudo nenhum deles me marcou como me marcaram os jogos da Lego.

Pensando agora chego a ter vontade de fazer uma analogia de Lego com Logo. Seria interessante, no mínimo. Poderia divagar em mil filosofemas por páginas e páginas. Poderia falar da minha relação com o mundo primeiramente com a Lego e depois com o Logo. Porém considero que não é isso que estou sentindo, e como desde a última postagem prometi sabe-se-lá-pra-quem que não mais escreveria com caixa baixa e sem parágrafos e muito menos no estilo que até o dia trinta de novembro vinha escrevendo, prefiro tecer essas minhas rasas considerações sobre esta tarde que antecipa a Noite de Natal.

Na realidade, acho que estou em busca de um sentido pra isso, pois é verídico que odeio dias brancos. Ontem também foi um dia branco, concordo, sobre ele até escrevi alguma coisa. Mas hoje, tarde que antecipa a Noite de Natal, ser ainda um dia branco, é algo que no mínimo me deixa sem ânimo. Faz com que eu não queira abrir as cortinas da biblioteca e deixe essa luz opaca iluminar minha caneca de café preta. Faz com que eu fique remoendo tudo quanto fiz no decorrer deste ano tão-somente porque algum Concílio da Igreja Católica Apostólica Romana decidiu que no dia vinte e quatro de dezembro haveria a Noite de Natal e ponto final. O que eles sabiam da minha vida?! Valha-me Deus, como dizia o Brás Cubas!

Concordo que essa coisa de Fim de Ano até tem um significado maior. Mas encordoar Noite de Natal com Fim de Ano já é demais pra minha cabeça e faz com que eu fique buscando motivos pra comemorar. Claro que as coisas não vão mal. Claro que as coisas não vão tão bem assim. Mas saber que a decisão de umas pessoas que jamais tiveram a capacidade de saber da minha existência influencia no meu aqui-agora, neste dia branco que agora mostra um sol tímido por sobre as poças que a chuva deixou, me faz ter vontade de inventar a Máquina do Tempo do H.G. Wells e dar uns bons sopapos nesses camaradas. Porém, creio que eu me diluiria em uma massa amorfa de espaço-tempo e tédio se o fizesse. Afinal, atingir a velocidade da luz não é brincadeira. Logo, fico com meu pequeno relato-crise desta tarde branca que traz consigo a Noite de Natal.

Mas será que ainda existem a Estrela, a Lego e a Gulliver?

Admito: eu queria é brincar nem que fosse de Jaspion lilliputtiano, pois ficar nessas de brincar com responsabilidade não dá certo, ainda mais quando o sujeito acorda e dá de cara com um pós-chuva somado a um dia branco que traz consigo a Noite de Natal.

E é essa minha angústia, distante de Concílios e refrigerantes, perto de um passado que agarro a partir das coisas que lembro mas que sempre escapam quando o vento do agora me bate nas fuças.

(P.S.1: Quanto à foto, é o tal do Conjunto de Estrelas NGC 2264, coisa que a Agência Espacial Européia chamou de “árvore de Natal no Espaço”.)

(P.S.2: Essa coisa de chamar o tal do conjunto de estrelas de “árvore de Natal no Espaço” me lembra Umberto Eco. Em algum texto dele li sobre golfinhos humanizados para o nosso deleite. E disso nem preciso de prova: basta dizer que conversamos com cachorros e plantas (e eu converso com meu cáctus, do qual tenho um dó tremendo, confesso). O problema disso é que nada escapa ao nosso umbigo. Se o planeta e a coisas tem outro umbigo, pra nós que se dane, havemos de confessar.)

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